segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Zé Renato Daudt

´,Fico bastante contente de publicar depois de tanto tempo esta nova entrevista, com um talentoso compositor de letra e música: Zé Renato Daudt. Colecionador premiações nos festivais e um torcedor apaixonado pelo seu Colorado, "sempre..."! Aproveitem e deixem seus comentários.
:)
15ºEstância da Canção, São Gabriel/RS - melhor melodia


1.És natural de onde? Idade?
Rio Pardo/RS, 35 anos, tendo adotado a pequena Lavras do Sul, por opção e coração.

2.Qual sua relação com o campo, cavalo e a cidade grande?
O campo e o cavalo estão ligados a minha vida desde a infância em Rio Pardo/RS onde passava diversos períodos em estâncias de parentes e amigos. Na juventude, já em Lavras do Sul, minha terra de coração, esses laços se estreitaram em função dos costumes locais.

3.Suas referências e influências de vida (música, literatura, pessoas)?
Não sou suscetível a muitas influências, nem tenho muitas referências, sou bem eclético, mas sou fã de várias pessoas, entre elas: Érico Veríssimo, Ricardo Guiraldes na literatura, João Bosco na música. Pessoas?? Acho que admiro muitas, principalmente as de caráter, até porque ninguém é perfeito.

4.Como começaste sua relação com a música, com a composição; Como você vê o fato de morar na região da grande Porto Alegre e o que isso influência na tua composição?
Em 1998, meu parceiro Gujo Teixeira, chegou com metade de uma letra pra me pedir algumas dicas. Acabou que fizemos nossa primeira parceria. Fomos premiados com a música mais popular do 15º Reponte com a composição Milonga Praiana. Já se vão 10 anos.

5.O que fez com que tivesse certeza de seguir a carreira, o que te fez escolher a música nativista?
Não vivo da música nativista, componho por opção e não por profissão, embora tenha o mais profundo respeito e admiração daqueles que vivem da música.

6.O que te incentiva continuar?
Comentários de pessoas que nunca vi e que admiram o que componho, respeito dos demais músicos e intérpretes e uma eterna inquietude de tentar expor o que sinto, penso e vivo.

7.Como te imaginas daqui a algum tempo dentro cenário musical?
Nem idéia. Me imagino compondo da mesma forma como que venho fazendo. Participando de poucos festivais, porém sempre com qualidade.

8.Os sacrifícios que já fizeste pela música?
Nunca fiz sacrifícios pela música, se fizesse, talvez fosse a hora de pensar em parar de compor.

9.Te arrependes de ter feito algo ou não ter feito pela música?
Não, de jeito algum.

10.Inspirações para compor? Tens algum ritual que te ajuda a compor?
Minha esposa, minhas filhas, meus amigos e esse amor enorme pela nossa cultura, suas características e suas peculiaridades.

11.Tem alguma música que gostaria de ter feito e não fez, e o que fizeste e tens um carinho especial?
Várias. O cenário da música gaúcha é muito rico em obras musicais. Podem ser duas?? “Os da última tropa”, Sérgio Carvalho Pereira e “Ainda esses dias”, Gujo Teixeira. Das minhas, ‘À sombra de um cinamomo’, parceria com Joca Martins, tenho um enorme carinho por ela porque foi minha primeira letra ‘solo’ e com ela participamos da 20ª Coxilha Nativista-Cruz Alta/RS e da 30ª Califórnia da Canção-Uruguaiana/RS.

12.O que almeja que sua música alcance?
Alcance pessoas de bem e que parem pra entender o que minhas letras querem ou tentam dizer.


20º Festival de música Crioula de Santiago/RS - melhor letra


13.O que tem ouvido mais nos últimos tempos?
Leonel Gomes, Pirisca Grecco, Fito Paez.

14.Show que foste - livros que têm lido?
O último show foi um da Shana Muller em um projeto bem legal que está acontecendo em Porto Alegre (Segunda Regional). Livro, “Abusado”, de Caco Barcelos.

15.Como vês a influência da música da região do Prata na música nativista?
Salutar. Acho que conceitos retrógrados é que não podem existir. É sempre bom estar atento a culturas de um modo geral, principalmente as que tem tanta afinidade com a nossa cultura gaúcha, como é o caso da música da região do Prata.

16.Festivais, primeiro festival composição e parceria?
15º Reponte da Canção, São Lourenço do Sul/RS, Milonga Praiana (Zé Renato Daudt/Gujo Teixeira/Kako Xavier), interpretação de Kako Xavier e Joca Martins.

17.Como encaras esse meio ao mesmo tempo aberto, democrático, mas também bastante criticado por certa impressão de “panelas” dos festivais? Festivais em SC?
Encaro com muita naturalidade. Essa questão de supostas ‘panelas’ é antiga e jamais vai mudar. Pra mim, o que existe é maior ou menor afinidade musical entre jurados e compositores. Não acredito em beneficiamento de uns em detrimento a outros puramente por sacanagem e ausência de caráter. Prefiro acreditar em afinidades musicais. Acho que as comissões organizadoras é que deveriam deixar claro o que querem do seu festival ao convidar o corpo de jurados. Participei de três festivais em SC: a Sapecada-Lages, Canto dos Desgarrados-Itajaí e Laçada em Brusque. Três terceiros lugares, dois em Lages e outro em Itajaí.

18.Fala um pouco da tua experiência nessa trajetória dos festivais? Triagens, premiações, e como avalia a tua participação nos festivais que estão iniciando sua estrada, as vezes sem ajuda de custo, outras sem premiação enfim...?
Triagem e júri só participei de um, Bateada da Canção Nativa, em Lavras do Sul. Premiações são poucas também, mas muito importantes para mim: Música Mais Popular do 15º Reponte da Canção, Música Mais Popular do 9º Círio de Pelotas, 3º Lugar da 14ª e 15ª Sapecada da Canção Nativa, 2º Lugar e Melhor Letra do 20º Festival de Música Crioula de Santiago, 3º Lugar e melhor melodia na 15ª Estância da Canção em São Gabriel, e agora, semana passada, Música Mais Popular do 5º Aldeia da Música do Mercosul em Gravataí.

19.Vencer o bairrismo é algo que inevitavelmente, acontecerá...ou achas que não existe essa diferenciação de estados? Acreditas que algum dia a música mais trabalhada (gaúcha/nativista) alcance um respaldo maior dentro do cenário musical brasileiro?
Difícil, porém não impossível. O que acho é que não podemos nos prostituir fazendo músicas ditas populares esquecendo de conceitos, valores e qualidade simplesmente para vencer esse bairrismo imposto pela grande mídia nacional. Temos sim é que enaltecer o que fazemos na música nativista há muito tempo. Um dia, na insistência, acho que o resto do país dará valor ao que fazemos.

20.Fala um pouco da tua experiência como jurado, estás preparado pras críticas?
Tive uma única experiência como jurado, mas já deu pra ver a dificuldade que é o desempenho da função. Por outro lado, acredito que a crítica sobre um jurado é normal, costumeira, porém desnecessária. Acho que no momento que uma comissão organizadora convida uma pessoa para julgar o trabalho de colegas ela se torna co-responsável pelo resultado, afinal de contas conhece o trabalho do jurado, suas afinidades musicais e seus parceiros e sabe o que quer de seu festival, qual linha ele deverá adotar. Os concorrentes também têm essas informações, então devem ler conforme a cartilha, mas sempre respeitar o resultado, muito embora às vezes esse seja injusto tecnicamente e de encontro à vontade popular ou mesmo do concorrente.

21.O que pensas sobre a realização de festivais fechados, achas que seria possível fazer um festival apenas de música nativista instrumental, que pensas sobre isso?
Sempre que posso vou a festivais fechados. Renovo minhas idéias e sempre, mas sempre mesmo aprendo alguma coisa que agrego ao que componho. Ano passado fui 1º Lugar do Paradouro do Minuano na parceria de Márcio Nunes Correia e Juliano Moreno com uma obra que provavelmente fora daquele ambiente jamais teríamos composto. Quanto a festivais fechados de música instrumental acredito que seria uma ótima idéia, quem sabe mesclando poesia como, aliás já é feito em São Lourenço do Sul com o Seival da Poesia Gaúcha que não é fechado, mas possui uma linha de poesia e outra de música instrumental.

22.Como é a sua relação com os outros músicos de SC e RS?
De SC é pequena, até porque meu primeiro contato com músicos de SC foi por época da 14ª Sapecada. Agora esses dias o Índio Ribeiro cantou uma obra minha em Brusque. A tendência é que essa relação aumente e melhore a cada dia. Já no RS, a relação é muito boa.

23.Como é pra ti saber que sua música ganha fronteiras além do RS?
Excelente. É muito bom saber que não só no RS as pessoas cultivam raízes e escutam o que compomos.

24.Como lida com o assédio que vem naturalmente como resposta ao trabalho que desenvolve? Como é tua relação com os fãs e com os novos músicos?
Não tenho assédio sobre minha pessoa. Noto muito carinho de um pequeno número de pessoas que admiram o que componho. Procuro compartilhar e sorver desse carinho. Quanto a compositores novos, eu me considero um, pois acho que tenho muito a aprender, mas ao longo dos tempos tenho tentado ampliar minhas parcerias com compositores ainda desconhecidos do grande público e que aos poucos, com certeza, irão conquistar seu espaço.

25.Viver de música : utopia ou realidade?
Pra mim, nenhuma nem outra e sim uma coisa muito distante em virtude do número pequeno de composições e por adorar minha profissão, a advocacia.

26.Fala um pouco da música instrumental gaúcha e brasileira como um todo? Tua visão sobre como ela é vista e aceita pelo público.
Acho que vem melhorando essa visão do público com a música instrumental, porém, às vezes, é mais fácil para o grande público escutar algo mais dançante, mais ‘popular’ do que prestar atenção em melodias bem trabalhadas e de qualidade.

27.Qual é a melhor coisa do ambiente dos palcos, dos festivais, rodeios...?
O contato com parceiros, outros compositores e com o público em geral.

28.Como vês a divulgação que é feita das músicas em geral, dos festivais? Rádios, gravadoras?
Acho que ainda estamos vivendo um período de puro amadorismo nesse aspecto, às vezes até desrespeito com quem trabalha com música nativista. Por exemplo, muitas rádios sequer dão os nomes dos compositores quando rodam uma obra musical, completo absurdo isso. Parece que simplesmente o intérprete foi quem parou, pensou, escreveu o poema, musicou, gravou, etc....todos têm sua parcela de contribuição, então todos têm que ser lembrados.

29.Vais lançar teu trabalho em CD?, fala um pouco dele, das parcerias, gravadora, receptividade do público
...O projeto já existe sim....em princípio de forma independente e com repertório baseado em participações em festivais....parcerias com Gujo Teixeira, Marcelo Oliveira, Joca Martins, Diego Espíndola, Beto Borges, Fábio Maciel....interpretado por diversos intérpretes.....espero que o público goste do resultado.....

30.Em linhas gerais como avalia a tua imagem e responsabilidade sendo uma pessoa pública e voz para sentimentos de muitas pessoas?
Não me considero uma pessoa pública, mas minha responsabilidade é tentar transmitir conceitos e valores que acho importantes para a formação do caráter e da moral das pessoas.

31.A ânsia andarilha faz parte desse mundo festivaleiro, que pensas sobre isso.estar sempre na estrada? Como fica o coração nesse caminho? A família?
É brabo. A distância e a saudade fazem parte desse meio festivaleiro e inclusive são inspirações para composições. Sempre que posso carrego toda a tropa daqui do rancho.

32.Acreditas que a música feita hoje sobreviverá à voracidade e volatilidade do mundo de hoje, resistindo e sendo lembrada daqui a algum tempo?
Com certeza. Tanto é assim que apesar das dificuldades financeiras os festivais cada ano se renovam, surgem letristas, musicistas e intérpretes que seguirão carregando a bandeira do nativismo.

33.Que times torces, comidas, bebidas?
Glorioso Inter (Campeão do Mundo FIFA), churrasco e uma cerveja bem gelada.

34.O que te faz sentir de alma lavada?
Um elogio de alguém que admiro ou mesmo de um desconhecido sobre alguma obra minha, um abraço das minhas filhas, uma vitória num Grenal, tipo esse dos 4x1 desse ano ou pode ser de 1x0 em cima do Barcelona mesmo.

35.O que te faz sentir-se mal?!
Inveja e falta de caráter.

36.Fala um pouquinho da tua vida fora dos palcos?
Sou advogado. Atuo nas áreas trabalhista e cível, inclusive com direito autoral. Moro em Porto Alegre. Sou casado com alguém muito especial. Tenho duas filhas lindas: Isadora e Valentina. Prezo muito minha família e meus amigos. Tenho na música uma válvula de escape muito grande para agüentar as agruras da vida, tanto as minhas como as de meus clientes, pois tenho dificuldade em fazer essa divisão. Sou feliz com o que faço e com o que já conquistei, mas ainda estou engatinhando...

37.Planos pro futuro?
Viver bem. Com paz, saúde e alegria. Participar do Martin Fierro, um dos festivais que nunca tive o prazer de classificar uma composição, participar novamente da Sapecada.


Depoimento à Shana Muller na 15ºSapecada da Canção em Lages/SC,
Zé Renato tem dois terceiros lugares no festival ( 15º e 16º Edições).


38.Mensagem para as pessoas que admiram seu trabalho?
Apesar de compor pouco, componho de alma e coração tentando alcançar quem souber dar valor às coisas mais simples da vida, porém imprescindíveis.

39.Sua relação com a internet?
Boa....ela é minha parceira tanto como ferramenta de trabalho, quanto nas horas de compositor.

40.Acreditas na federalização do estados brasileiros?
Assunto complexo. Existem prós e contras muito definidos. Se por um lado as distâncias de um país enorme como o Brasil prejudicam o crescimento de alguns Estados, por outro, também sou contra a qualquer tipo de preconceito, seja religioso, racial ou que conduza ao isolamento ou segregação.

41.Fala um pouco de Lages, o que te chamou mais atenção, se quiser falar sobre as pessoas, enfim, fica a vontade.
Sempre tive grande expectativa de conhecer Lages em função da Sapecada. Não me decepcionei nem com o festival, muito menos com seu público. Calor humano, respeito pelos artista que estão no palco são atributos que norteiam o povo lageano. Pessoas?? Bah....o Tio Lélo é excelente. Devo muito carinho pelo tratamento que ele dispensou a mim e a minha família quando conhecemos a Fazenda do Barreiro. Como ele mesmo fala...’um VIVA PRO TIO LÉLO’...ehehehe... Espero retornar à Lages e conhecer mais pessoas desse quilate.

42.Pra ti como é encarar as grandes polêmicas que assolam o nativismo, as disputas de poder, as rixas nos Ctgs, discussão do que é bom e do que é ruim e como avalia a nova geração de músicos e compositores que vêm por aí?
Essas polêmicas sempre existiram e sempre existirão. Acho que cada um tem que fazer a sua parte e cuidar do seu próprio umbigo. Bom ou ruim depende do gosto pessoal de cada um, então...Quanto a novos talentos acho que a música nativista ao longo dos anos vem sendo um celeiro e sempre vai ser assim. Nós, brasileiros, somos musicais por excelência.

43.Como vês a relação da música nativista com as rusgas das entidades tradicionalistas ?
Como já referi, acho que cada um deve fazer sua parte, sem se preocupar com preconceitos ou com o que o outro está fazendo. Menos discórdia e controversas e mais ação por nossa cultura.


Abraço a todos, outubro de 2008.
Zé Renato Daudt